Vegetariano Flexível: entrevista com Mayumi Delgado

Por À Roda da Alimentação

A propósito do lançamento do livro Vegetariano Flexível – concebido pela equipa Yämmi e publicado pela Casa das Letras (Grupo Leya) – conversámos com Mayumi Thaís Delgado sobre o seu trabalho, alimentação flexível e uma vida mais sustentável.

Flexibilidade alimentar é conceito que deu origem ao livro com mais de 70 receitas criativas para fazer com robots de cozinha (inclusive a Yämmi do Continente) e que são aliados da alimentação saudável, saborosa e sustentável.

Pensado para toda a gente, desde aqueles que querem apenas fazer algumas receitas vegetarianas de vez em quando até aos que já se renderam por inteiro a este tipo de alimentação, o ponto de partida do novo livro é o mundo dos vegetais – privilegiando o seu consumo e reduzindo o consumo de carne e peixe – e a flexibilidade alimentar, que permite a cada um escolher aquilo que come de acordo com o seu próprio ritmo.

Prático e inspirador este livro oferece muitas dicas, informações e respostas a todas as questões, que permitem desconstruir mitos à volta da alimentação flexitariana e escolher o que é melhor para cada um de nós.

 Mayumi Thaís Delgado está em profunda sintonia com os pressupostos deste trabalho. Quando lhe apresentamos o livro, aproveitámos para conversar um pouco sobre o flexitarianismo e como é urgente mudarmos o nosso quadro mental.

A necessidade de reduzir o consumo de produtos de origem animal e fazer uma alimentação de base vegetal já não tem retorno. Mas em compensação, podemos tornar-nos cidadãos bastante mais saudáveis, responsáveis e económicos, num mundo inspirador e muito mais verde, onde predomina literalmente a esperança num futuro melhor e a aventura por novos sabores.

Enquanto nutricionista, em que consiste o seu trabalho e como é que lida com uma responsabilidade dessa dimensão?

Tenho o privilégio de liderar uma equipa fantástica e dedicada à marca Continente; coordeno o trabalho que fazem na avaliação das novas propostas de produto para integrarem as nossas gamas, na definição dos critérios nutricionais que devem cumprir e na estratégia de reformulação nutricional de produtos já em comercialização. É também nossa missão garantir que a comunicação é pautada pelo rigor legal e científico, pelo que faz parte das nossas tarefas diárias a produção e a validação de conteúdos para os vários meios de comunicação. Todo o trabalho da equipa tem por base as premissas da Roda da Alimentação Mediterrânica e a evolução científica, quer seja em termos dos critérios nutricionais que estabelece, quer seja na comunicação que se faz no âmbito da nutrição e saúde.

Recentemente lançámos um novo livro da Yämmi com um título muito curioso: Vegetariano Flexível. O que é para si um «vegetariano flexível»?

vegetarianismo é um padrão alimentar de base vegetal ou «plant based». Cada vez são mais os que optam por este padrão alimentar, por diferentes razões, sejam elas questões ambientais, questões de saúde ou relacionadas com o bem-estar animal.

Ovolactovegetariano – permite a ingestão de ovos, lacticínios e mel.
Lactovegetariano – permite a ingestão de lacticínios e mel.
Ovovegetariano – permite a ingestão de ovos e mel.
Vegetariano estrito – exclui todos os alimentos de origem animal.

Existe ainda o veganismo, que, mais do que um padrão alimentar que exclui todos os alimentos de origem animal, é um modo de vida.
Este título veio, no fundo, criar uma curiosidade para este mundo mais plant based. Todos sabemos que a maioria da população consome mais proteína animal do que deveria e este livro pretende despertar para essa problemática, incentivando a redução do consumo de produtos de origem animal e um maior consumo de alimentos de base vegetal. Também sabemos que para muitos é difícil fazer essa transição, por isso, deve ser algo prazeroso e apelativo. E a flexibilidade ajuda a que, dentro do padrão alimentar de cada um, se possam ir adotando estratégias e receitas que passem a fazer parte do seu quotidiano.

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Se alguém quiser começar a seguir a nova tendência nutricional do «flexitarianismo», o que deve começar por fazer e quais são os passos a seguir?

O termo flexitariano deriva exatamente das palavras «vegetariano» e «flexível». No flexitarianismo pretende-se um maior consumo de alimentos de origem vegetal, ou seja, uma alimentação de base vegetal, também comummente dita «plant-based», mas sem exclusão de alimentos de origem animal, apenas a sua redução. Tal como noutros padrões alimentares, neste padrão privilegia-se os produtos sazonais de produção local e sustentáveis, claramente muitos «eixos» vencedores.

Para se adotar um novo padrão alimentar não existem regras fixas. Deve partir de cada pessoa estabelecer os seus objetivos e metas. Se, por exemplo, uma pessoa nunca fez uma refeição vegetariana, o objetivo pode ser introduzir uma nova receita a cada semana e ir aumentando o número de refeições de base vegetal. Se para uns pode ser fácil mudar rapidamente, para outros pode ser mais complexo. Também aconselho a que se recorra a um nutricionista para partilhar dúvidas e anseios nesta transição.

Como é que será a nossa alimentação daqui a um século? Vamos produzir carne sintética, comer insetos, o que é nos espera?

Independentemente de ser daqui a um século ou daqui a alguns 20 ou 30 anos, sabemos que o crescimento da população vai levar à escassez de recursos naturais e isso terá impacto na alimentação do futuro. Um futuro que, para muitos, tem tanto de emocionante como de aterrorizador! Mas a ciência e a tecnologia estão de mãos dadas para nos ajudar! A carne produzida em laboratório já é uma realidade, só ainda não está disponível nos supermercados. No caso dos insetos, esses já os encontramos à venda em diversos locais e existem muitas receitas enriquecidas com os mesmos que são deliciosas. É tudo uma questão cultural que eu acredito que com o tempo nos vamos habituar. Mas existem mais novidades, a impressão 3D, os comprimidos e pílulas como substitutos de refeição, a nutrição personalizada, enfim…
Efetivamente, não conseguimos prever o futuro, mas temos de estar preparados e disponíveis para a novidade, pois claramente a alimentação vai mudar.

Temos melhores condições e informação para comer mais corretamente hoje do que há 50 anos. Tem uma visão otimista acerca da forma como os portugueses se alimentam atualmente, considerando a invasão de produtos nefastos para a saúde no mercado e o grau de obesidade entre os jovens?

A indústria não pode ser só vista como a vilã. Aliás, existe um esforço para que se ofereçam cada vez mais produtos nutricionalmente mais equilibrados, exatamente porque se sabe o impacto que têm na saúde dos consumidores. Posso dar o exemplo do Continente: nos últimos dois a três anos, mais de 300 produtos de marca própria foram intervencionados para retirar, eliminar ou reduzir os ingredientes, que, quando consumidos em excesso, podem trazer vários problemas de saúde, nomeadamente o açúcar, as gorduras, as gorduras saturadas e o sal. Ainda na área da nutrição saudável, estamos a reforçar as gamas de produtos equilibrados Continente Equilíbrio, biológicos Continente Bio e, para bebé, Continente do Bebé, de forma a dar aos clientes novas opções. Esta estratégia estende-se também à educação e literacia em nutrição e saúde, não só dos nossos colaboradores com formações internas, como também do público em geral através do programa À Roda da Alimentação e da Escola Missão Continente.

Mayumi Thaís Delgado é licenciada em Ciências da Nutrição e e Mestre em Publicidade e Marketing. Atualmente, coordena a Equipa de Nutrição e Investigação da Sonae MC.

Autor

À Roda da Alimentação